O que você prefere? embarcar ou desembarcar? ir ou voltar?
"Desde já, deixamos evidente que respeitamos os que odeiam viajar. São opções diferentes de vida"Aguardem! Dia 9 de novembro, sob a Coordenação Editorial de Leonardo Dias, Ed. Aliança, na condição de jornalista, escritora e docente, estaremos lançando a versão impressa de “Embarques e desembarques: relatos de viagens”, na Livraria Entrelivros, às 19 horas. Desde já, deixamos evidente que respeitamos os que odeiam viajar. São opções diferentes de vida. Iniciamos a publicação, exatamente, narrando quando descobrimos pela primeira vez, aos 27 anos, o encanto que há em desvendar universos distintos dos quais vivemos a rotina do dia a dia.
Por tudo isto, concordamos, na íntegra, com quem, a exemplo da cronista Martha Medeiros diz literalmente: “Se para você é um suplício abandonar seu sofá, seu carro, seu travesseiro e o “Fantástico” aos domingos, não viaje. Se você é do tipo que não consegue se maravilhar com o que está vendo porque está mais preocupado com os mosquitos, os remédios, as gorjetas, o fuso horário e em checar os e-mails do trabalho, não viaje. Se você não faz ideia em que ponto do mapa fica o local para onde está indo, não tem a mínima curiosidade sobre a cultura do lugar, até desconhece o idioma falado, não viaje. Se você está fazendo as malas sob coação, pois sua mulher o ameaçou com o divórcio, faz bem em ter juízo, vá com ela. Mas, fora algum outro caso assim extremo, não viaje. Não é obrigatório. Não assegura uma vaga no céu. Viajar é para quem tem espírito desbravador, mas se você não tem, não tem”.
Não é pecado curtir seu travesseiro; amar seu quartinho; sentir saudades extremas de seu pet; satisfazer-se com as imagens e reportagens publicadas em revistas ou programas televisivos acerca de recantos espalhados mundo afora. Cada um tem sua opção de lazer. Em nosso caso, preferimos carrinho velhinho, roupas repetidas à exaustão; ou não possuir joias além das herdadas de família. Amamos viajar como estratégia de desvendamento do mundo. Desconfiamos que isto nos tornou mais humana no sentido de conviver com diversidades de qualquer natureza. Aprendemos a respeitar hábitos estranhos. Por exemplo, salvo raras exceções, de imediato, os cubanos nos perguntam idade e salário. Descobrir nos dá dimensão da vida dessa gente: os míseros salários e a chance de uma velhice para lá de assustadora, lhes leva a comparar a vida de outra gente com a sua de forma quase compulsiva. Aprendemos, ainda, a conter aquela “cara de nojo” diante de besouros torradinhos ou similares. Basta portar uma “linda cara de paisagem”. É uma aprendizagem contínua!
Afinal, inexistem receitas para uma viagem aprazível. Conhecer um pouquinho que seja o que virá adiante é básico. Não reclamar tanto. Não zombar tanto. Não discordar tanto. Devemos nos apegar ao que existe de mais belo em cada país. E ponto final. Além do mais, é preciso compreender ser inviável conhecer uma civilização num intervalo de tempo muito curto. Rememoramos, então, nossa primeira viagem “Europa Maravilhosa”: 10 países em 30 dias. Findo o percurso, voltamos com a frustração dolorida de vista enevoada. A prova evidente é que, num exercício “nós conosco mesmo”, ao elaborar “Embarques e desembarques...” corremos para os álbuns em papel de então para brincar de recordar o que a memória havia retido...
Estivemos até hoje em cerca de 70 países – mas registrem! Já estou instaurada (e não grudada na Senhora Velhice); a UFPI há tempo nos despachou; os convites que poderiam mostrar o que retivemos de conhecimentos aprendidos e apreendidos rareiam mais e mais. Aliás, a grande intelectual e Imortal Nélida Piñon, do alto de seus 85 anos de plena e profícua atividade denunciou, agora, 2022, preconceito contra os escritores mais velhos, comprovando desde já as distinções entre Ocidente e Oriente. Neste último, os velhos são reconhecidos por sua trajetória e história de vida que carregam de suas coletividades. São exaltados e reverenciados.
Assim, vamos passeando por continentes – América, África, Ásia, Europa e Oceania –, excluindo Antártida, onde ainda não estivemos. De qualquer forma, dentre os países visitados, diante da impossibilidade de explorar todos num mesmo momento, decidimos lembrar com vocês ou para vocês os 34 mais marcantes para nós, incluindo obviamente nosso Brasil! Aliás, a capa de “Embarques e desembarques...” dá ideia de quanto ainda há a percorrer e prosseguir!
Há tanto a recordar. O escritor norte-americano Thornton Wilder costuma dizer: “É quando calçamos os chinelos que sonhamos com aventuras. Em plena aventura, temos saudade de nossos chinelos”. Há tanto para ver, sonhar, refletir, confrontar... Há tanto deslumbramento... Há tanta coerência e incoerência própria de qualquer nação, que é melhor esquecer os chinelos... Catar está na onda do Ocidente tanto por sua classificação como o país mais rico do mundo, segundo o FMI, quanto por sediar a Copa do Mundo a partir do próximo 20 de novembro, o que garante espaço na mídia internacional e nacional, embora, a bem da verdade, o jogo mais popular desde a infância para o catariano é o xadrez! Há tabuleiros para dar e vender! Rua afora ou rua abaixo, inclusive em parques.
Há fatos simples ou simplórios que encantam: as festas de debutante das jovens cubanas que camuflam as agruras financeiras. Tendem a substituir os onerosos álbuns de fotos por comemoração em cocotaxis, nos quais desfilam pelas ruas acompanhadas de um cortejo com as amigas mais próximas. As bodas dos russos festejadas com bebida e muitas flores em plenas ruas ou à margem dos numerosos rios dão vida a um cartão postal internalizado para sempre. A simplicidade do francês ao assoar o nariz (com tudo o que tem direito) à mesa e em plena refeição também surpreende. Existem descobertas simples e curiosas, como o “bacalhau fake”, ou seja, o bacalhau português, tão popular mundo afora, é pescado no litoral da Noruega. Inexiste em mares portugueses. E há o vocabulário / o significado bem específico e diferenciado de um país a outro.
Os rickshaws nos matam de susto na Índia com sua velocidade maluca. No Quênia, como resultado de uma história de amor da obra de um casal diante dos elefantes-bebês, o orfanato de elefantes, confesso, é meu eterno xodó!
O “Parque dos Gatos” (Peru) constitui um caso à parte! A “terra dos cangurus” (Austrália) com suas diferentes espécies! A beleza extrema do Cristo Negro, no Panamá, como o “Padroeiro dos Criminosos.” Em Barcelona, o dia de Dia de Sant Jordi com flores e livros aos montes.
As enormes torres humanas da Catalunha erguidas em Montjuïc. As rosas do deserto da Tunísia... No Arquipélago de Açores (Portugal), na ilha de Pico, é inesquecível o “Projeto sorrisos de pedra”! Enfim, “Embarques e desembarques: relatos de viagens” não é um guia de viagem. Não somos expert nem em geografia nem em história nem em políticas internacionais nem em turismo. O intuito maior é mostrar que viajar pode transformar alma e mente ao favorecer a sensação de generosidade, acolhimento e tolerância frente às dessemelhanças, deixando de lado ideias enraizadas, conscientes ou não, de como os demais povos devem se portar ou se comportar! E então, decida livremente: o que prefere? Embarcar ou desembarcar? Ir ou voltar?
Maria das Graças Targino, jornalista e pós-doutora em jornalismo pela Universidad de Salamanca / Instituto Interuniversitario de Iberoamérica.
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