TCE-PI aponta rombo de R$ 1,07 milhão em Wall Ferraz: empresa sem capacidade recebeu por serviços não comprovados

Mesmo após a inspeção, o Tribunal identificou que a Prefeitura de Wall Ferraz continuou realizando pagamentos, inclusive uma transferência de R$ 52.811,48 em 22 de agosto de 2025

O Tribunal de Contas do Estado do Piauí (TCE-PI) concedeu medida cautelar para suspender integralmente o Contrato nº 003/2025, firmado entre a Prefeitura de Wall Ferraz e a empresa R N Construtora LTDA, após identificar um conjunto robusto de irregularidades graves que indicam inexecução contratual, fiscalização deficiente, pagamentos sem comprovação e prejuízo aos cofres públicos.

Foto: Reprodução / InstagramPrefeito de Wall Ferraz, Guilherme Maia
Prefeito de Wall Ferraz, Guilherme Maia

A decisão, de nº 395/2025-GFI, foi proferida pela conselheira Flora Izabel Nobre Rodrigues, no âmbito de representação apresentada pela Diretoria de Fiscalização de Licitações e Contratações do próprio Tribunal.

O contrato suspenso decorre do Pregão Eletrônico nº 035/2024 e tem como objeto a locação de máquinas pesadas e caminhões, sem operador e sem combustível, para a recuperação e revitalização de barragens no município. O ajuste foi assinado em 21 de janeiro de 2025, com vigência até 21 de janeiro de 2026.

Mesmo estando em plena execução, o TCE-PI constatou que os serviços pagos não foram devidamente comprovados, além de fortes indícios de que as obras simplesmente não foram realizadas, apesar dos repasses financeiros já efetuados.

Durante inspeção realizada entre 3 e 9 de agosto de 2025, auditores do TCE-PI verificaram que a R N Construtora LTDA, sediada formalmente em Picos, funciona em um imóvel residencial e não possui estrutura operacional compatível com os serviços contratados.

Segundo o relatório técnico, a empresa possui apenas quatro empregados registrados; conta com somente uma escavadeira hidráulica compatível com o objeto do contrato; mantém contratos semelhantes simultaneamente em vários municípios, o que reforça a suspeita de incapacidade operacional ou até subcontratação integral, prática expressamente vedada pelo contrato.

Ainda assim, a empresa já recebeu R$ 7,3 milhões apenas da Prefeitura de Wall Ferraz, valor que representa mais da metade de tudo o que a empresa recebeu de municípios piauienses entre 2020 e 2025, totalizando R$ 13,1 milhões em recursos públicos.

Um dos pontos mais graves apontados pelo Tribunal foi a ausência de comprovação documental da execução dos serviços. Os processos de pagamento analisados apresentavam: relatórios genéricos; atestos sem detalhamento técnico; ausência de registros fotográficos do “antes, durante e depois”; falta de medições, diários de obra, boletins de horas-máquina e georreferenciamento.

Mesmo assim, foram pagos R$ 1.076.750,77 com base em documentação considerada insuficiente, em afronta direta aos artigos 62 e 63 da Lei nº 4.320/1964, que tratam da correta liquidação da despesa pública.

Barragem do Jenipapeiro: serviço pago, obra inexistente

A inspeção do TCE-PI trouxe um dado ainda mais alarmante. Em relação à Barragem do Jenipapeiro, onde supostamente teriam sido realizados serviços entre 19 e 27 de junho de 2025, os auditores constataram in loco que nenhuma intervenção foi feita no local.

Moradores da região confirmaram que nenhuma obra ocorreu no período informado, e as imagens coletadas mostraram que a barragem permanece idêntica aos registros fotográficos de 2024, anteriores ao contrato. Mesmo assim, o serviço foi pago integralmente pela prefeitura.

A fiscal do contrato, Taynara Jericó da Silva, declarou que realizava vistorias e atestava as despesas com base em levantamentos de horas-máquina. No entanto, o Tribunal concluiu que essas declarações não se sustentam diante das provas técnicas, já que as máquinas não estavam no município, não havia registros materiais da execução e os relatórios eram meramente declaratórios.

Para o TCE-PI, a fiscalização foi ineficiente e omissa, configurando violação direta à Lei nº 14.133/2021, que impõe ao gestor o dever legal de acompanhar e registrar a execução dos contratos administrativos.

Outro ponto destacado foi o descumprimento das normas de transparência. Apesar de o contrato estar cadastrado no sistema Contratos Web, nenhuma informação sobre a execução foi inserida, o que prejudica tanto o controle externo quanto o acompanhamento pela sociedade.

Mesmo após a inspeção, o Tribunal identificou que a Prefeitura de Wall Ferraz continuou realizando pagamentos, inclusive uma transferência de R$ 52.811,48 em 22 de agosto de 2025, reforçando o risco de continuidade da malversação de recursos públicos.

Diante desse cenário, a relatora concluiu que estão presentes fumus boni iuris: fortes indícios de ilegalidade e inexecução e periculum in mora: risco concreto de agravamento do prejuízo.

Com base nas evidências, o TCE-PI determinou a suspensão imediata do contrato, incluindo ordens de serviço, medições e pagamentos; notificação urgente do prefeito Luiz Guilherme Maia de Sousa e do secretário de Obras Giderson Antonio dos Santos Barros; publicação da decisão e prosseguimento do processo para apuração de responsabilidades.

O Tribunal destacou ainda que os fatos podem configurar improbidade administrativa, além de violação aos princípios da legalidade, economicidade e moralidade, não afastando a possibilidade de Tomada de Contas Especial para quantificação definitiva do dano e responsabilização dos envolvidos.

Fonte: JTNEWS

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